A CRISE ESTRUTURAL NO DIREITO PENAL BRASILEIRO
O presente artigo tem como objetivo levar o leitor a reflexões e a motivar o necessário despertar para a inegável crise estrutural que se encontra o Direito Penal no Brasil e no mundo, na medida em que seus conceitos básicos estão sendo desvirtuados, imperando o normativismo exacerbado, tolhendo direitos e garantias, desviando as reais funções das ciências criminais.
O legislador Constitucional de 1988, inspirado nos ideais neoliberais e no garantismo, conferiu aos cidadões brasileiros garantias penais e processuais, dentre elas a Presunção de Inocência do Contraditório da Ampla Defesa e do Devido Processo Legal, entretanto o legislador infraconstitucional, inegavelmente nas ultimas décadas tem diminuído estas garantias consideravelmente no sistema jurídico penal, hoje dominando o direito penal e processual o caos a insegurança criados pelo normativismo.
A doutrina do direito penal vem orientando seus enfoques, nos últimos anos, a certos dispositivos do Direito Penal positivo que, em virtude de determinadas característica, parecem desviar-se dos princípios e regras do Direito Penal geral, bem como seus fins, caindo em pleno retrocesso. Surge então o Direito Penal do Inimigo, em 1985, que tem como idealizador o jurista alemão Gunther Jakobs,, sob forma de um conceito doutrinário, é também de um postulado político criminal, que prega que o indivíduo que quebra o Contrato Social, deve ser tratado como inimigo da sociedade.
Embora a doutrina de Jakobs tenha encontrado um rechaço majoritário enquanto discurso teórico doutrinário e enquanto orientação Político Criminal, sem dúvidas esta sendo reconhecida por todos a existência real de uma influencia na legislação infraconstitucional brasileira e no âmbito mundial, seja no direito ou no processo penal da atualidade, o que obviamente é objeto de critica e de rechaço de parte dos doutrinadores, internacionais e nacionais.
Para Jakobs, há indivíduos que deveriam ser tachados como inimigos. Essa diferenciação seria estabelecida com respeito aos chamados dos cidadões. Por essa razão Jakobs individualiza e distingue um direito penal do inimigo, que ele contrapõe ao direito penal do cidadão, o qual confere todas as garantias individuais constitucionais.
Concretamente, no Direito penal do inimigo verifica-se uma renuncia as garantias materiais e processuais do direito penal da normalidade. Esses princípios e regras próprios do direito penal do inimigo seriam impostos pelos significados das circunstâncias fáticas que caracterizam a atividade e posição do inimigo, frente a sociedade, e sua configuração seria a de instrumentos adequados ao fim de prevenção do perigo que representa o inimigo, só pode ser combatido através de sua derrota ou eliminação na guerra desencadeada entre ele e o Estado.
Uma primeira manifestação do Direito Penal do Inimigo é aquela representada pelos tipos penais que proporcionam uma ampla antecipação de punibilidade para permitir o alcance de momentos nos quais os atos realizados só possuem o caráter de preparatórios de fatos futuros.
Uma segunda característica que permitiria inserir determinada normativa no Direito penal do Inimigo seria a desproporcionalidade das penas, que se manifestaria em um duplo sentido. Por um lado, a criminalização de condutas no âmbito prévio, isto é a punibilidade de atos preparatórios, sem a redução da pena com relação a fixada para os fatos consumados ou tentados, valorando como perigoso o ato preparatório realizado nessa esfera previa.
Não só no Brasil, na América Latina, bem como em outros paises, inúmeras leis penais vêm tendo a influencias da teoria sustentada por Jakobs as quais se autodenominam, explicita e precisamente, “leis de luta ou de combate” o que representa uma “transformação da legislação penal em uma legislação de luta”.
Assim, questiona-se até mesmo a presunção de inocência, por se contraria a exigência de veracidade no procedimento, são reduzidas consideravelmente as exigências de licitude e admissibilidade da prova, são introduzidas medidas amplas de intervenção nas comunicações, de investigação secreta ou clandestina, de incomunicabilidade, e por fim são ampliados os prazos de detenção policial para o cumprimento de fins investigatório, como os de prisão temporária e preventiva e por fim não podendo ser esquecidas determinadas normas do direito penitenciário que sem duvidas constituem exemplos típicos do Direito Penal do Inimigo.
No aspecto processual penal podemos citar a prisão preventiva, medida cautelar utilizada no curso de processo, fundada no combate de um perigo, de fuga, de cometimento de outros crimes e de adulteração de provas etc., medidas processuais restritivas de liberdades fundamentais, como a interceptação das comunicações telefônicas, cuja produção se dá sem a comunicação previa ao investiga do ou ao acusado, e a gravação ambiental e por fim a possibilidade de decretação da incomunicabilidade de presos perigosos etc.
Não há como negar que a teoria sustentada pelo jurista alemão Gunther Jackobs esta totalmente divorciada da função do Direito Penal, qual seja a proteção aos bens jurídicos considerados mais importantes pela sociedade, sendo totalmente Inconstitucional, uma vez que ofende vários princípios basilares do direito penal constitucionais, sendo que, tal teoria apregoa que a pessoa seja tratada como mero objeto, ferindo o tão propagado principio da dignidade da pessoa humana, sem falar do principio da proibição do retrocesso.
Na realidade o maior perigo do Direito Penal do Inimigo e o perigo de contágio, o que se pode verificar que, infelizmente, o legislador e os tribunais já foram contaminado, sendo que a cada fato de comoção social que ocorre, seja no Brasil, ou no mundo, lançam no ordenamento jurídico pacotes de endurecimento das leis penais, vendendo esta idéia para a sociedade de que com isto faria reduzir nossos crônicos problemas de criminalidade ao invés de tomar alguma medida para combater as causas da violência nacional.
Autor: MIGUEL JUAREZ R. ZAIM
(ADVOGADO EM CUIABÁ/MT) – Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais, Especialista em Direito e Processo Penal, Direito e Processo Civil, Direito Constitucional, Direito Tributário, Direito Imobiliário e Direito Ambiental.